Sociedade da Transparência

Em advertência Rousseau dizia: “Não faça e não diga nada que o mundo inteiro não possa ver ou não possa ouvir”, a era digital nos confronta com a realidade que mundo inteiro pode ver e ouvir tudo. Mas imersos nessa água permanecemos alheios a essa realidade. Nos afundamos em nós mesmos contagiados pela exposição e sem perceber tornamos nossas vidas obscenas. “Obscena é a coação de colocar tudo à mercê da comunicação ou da visibilidade”. Reduzimo-nos a objeto-propaganda em que “tudo se mensura em seu valor expositivo.”

Toda a hipervisibilidade então se converte em uma sociedade parassocial onde as relações interpessoais se diluem em interações mediadas por telas. A visualização se torna o consumo do outro. O posar se torna a forma de ser, um simulacro para o digital. O posar é fazer-se, dissolver-se na performance expositiva. O valor das relações passa a ser medida pela velocidade e troca de informações. Informações tornam-se rasas e planas, em meio digital perdem toda a negatividade, constituem-se como meros números. Não se formam relacionamentos ou comunidades. “Surgem apenas certos ajuntamentos e agrupamentos de diversos indivíduos isolados singularmente, de egos que perseguem um interesse comum ou que se agrupam em torno de uma marca”.

Transformados em mera mercadoria-informação, flutuamos na rede em estado de hipervisibilidade e hipercomunicação. Somos mais produtos da rede do que usuários, servimos de dados para o consumo. Tudo se torna propaganda “com o objetivo de incrementar o capital da atenção do público.”

A existência hiper visível, transparente, leva à alienação. “Exposição é exploração” “a transparência caminha passo a passo com um vazio de sentido. A massa de informações e de comunicação surge de um horror vacui.” Perdemos qualquer tipo de reflexão. “As imagens preenchidas pelo valor expositivo não demonstram qualquer complexidade; são univocamente claras, i. é, pornográficas. Falta-lhes qualquer tipo de fragilidade que pudesse desencadear uma reflexão, um reconsiderar, um repensar.”

Assim como a fotografia superexposta o sujeito hiperexposto se dissolve em uma superfície plana, desprovida de negatividade, relevo e sombras – elementos essenciais à construção da identidade. A hipervisibilidade, portanto, não nos aproxima, mas nos distancia. É preciso recobrar certa negatividade das relações humanas. Há uma magia no que é oculto, no que é antes uma amplidão contemplativa. Se torna necessário abandonar a excitação e satisfação imediata em prol de uma privança. Demorar-se é primordial, é apenas na distância que se adquire perspectiva.

Nota: Esse é um pequeno resumo de Sociedade da transparência de Byun-Chul Han, todas as citações são tiraradas diretamente do livro.